Viés do custo irrecuperável

03 junho, 2021 por Aurélio Pita

Imaginemos o seguinte, estamos em casa e notamos que temos algumas compras para fazer. Vamos em direção ao supermercado, quando a meio caminho apercebemo-nos que hoje é feriado e os supermercados estão todos fechados. Devemos continuar o caminho ou voltar para casa, visto que viagem será em vão?

Neste caso, é claro perceber que a melhor opção será voltar para casa, uma vez que o nosso objetivo não será comprido, mesmo que continuemos a viagem, mas há casos onde esta visão não é tão simples.

Imaginemos agora que estamos num trabalho que não gostamos, ou não nos sentimos completamente realizados. Por outro lado, lutamos tanto para chegar ali, estudamos, dedicamos muitas horas, muito esforço, mas mesmo assim sentimos que algo não está certo, não gostamos do que fazemos ou não temos futuro. Devemos trocar de trabalho ou continuar no mesmo?

O que acontece é que muita gente continuará no trabalho, pois toda a sua dedicação e esforço não podem ser deitados ao lixo. A verdade é que estamos numa viés, uma vez que estamos a deixar o nosso passado decidir o nosso futuro.

No exemplo do supermercado é relativamente fácil de perceber que todo o caminho percorrido até ali pode e deve ser deitado fora, porque desistir trará-nos mais vantagens. No exemplo do trabalho, onde deveríamos utilizar o mesmo pensamento, não conseguimos fazê-lo, pois para nós é difícil desistir de coisas que dedicamos muito esforço, mesmo sendo a melhor decisão para o futuro.

Custos Irrecuperáveis

Os custos irrecuperáveis geralmente são medidos com esforço, tempo ou dinheiro. No exemplo do supermercado é impossível recuperar o tempo perdido. No exemplo do trabalho é impossível recuperar, não só o tempo, como também o esforço.

O grande problema é que damos demasiada importância aos custos irrecuperáveis, levando-nos a sentir que temos demasiado investido para desistir.

Outra razão para isto acontecer é o facto de não gostamos de perder. Imaginemos que compramos um bilhete para o cinema. Após isso, um amigo convida-nos para um jantar com concerto ao vivo, tudo pago. O provável é não aceitarmos o convite porque já compramos o bilhete para o cinema, não queremos perder o dinheiro do bilhete, mesmo que o jantar e o concerto sejam a opção mais vantajosa monetariamente. Para não perdermos 6 euros, não aceitamos algo que custa dez vezes mais.

Exemplos clássicos

Podemos encontrar este viés em tudo na nossa vida. Alguém num relacionamento infeliz, não acaba a relação porque dedicou muito tempo a ela. Alguém que comprou um carro mais caro do que consegue pagar, não o vende para não perder o dinheiro investido. Alguém que tem um projeto pessoal que não tem futuro, não desiste porque se esforçou demasiado.

Devemos desistir de tudo?

Ao falar do viés do custo irrecuperável parece que temos uma desculpa para desistir de tudo o que não queremos fazer, mas não é isso que ele nos ensina.

O que nos ensina é que devemos fazer escolhas para o futuro sem deixar que o passado nos afete. O que aconteceu, aconteceu, e não podemos alterar esse facto.

Uma forma de verificarmos se estamos a ser vítimas do viés do custo irrecuperável é analisarmos se tomaríamos a mesma decisão hoje.

Por exemplo, voltaria a aceitar este trabalho hoje? Começaria a namorar hoje? Compraria o mesmo carro hoje? Se a resposta for não, o provável é estarmos enviesados e a deixar o passado afetar-nos o futuro.

Não podemos ter medo de querer alterar a nossa vida para melhor. As grandes decisões não são fáceis de tomar, mas se estivermos conscientes do viés do custo irrecuperável, teremos mais um factor de decisão do nosso lado.


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